Nesta manhã, resolvi fazer um passeio mais curto. Tinha alguns planos ambiciosos¹ na véspera, mas acabei optando por um passeio mais local. Após consultar o Google Maps e ver os destinos interessantes, lembrei-me de João Ayres, cuja estação visitamos lá em 2015! Na época, tinha tanto mato que não conseguimos nos aproximar muito do prédio, que tem um estilo arquitetônico bem interessante, bem único para a região. Também poderia aproveitar para explorar melhor as redondezas, buscando encontrar o memorial do grande acidente ferroviário de 1938, que vitimou o escoteiro Caio Vianna Martins, e também tentar o retorno por outro trajeto.
Saí pela manhã, não muito cedo, considerando que não andaria grandes distâncias. Apesar de ter programado inicialmente pegar a rodovia asfaltada para Antônio Carlos, mudei de ideia e rumei para Campolide. De lá, pude percorrer mais uma vez o antigo leito da Linha da Oeste de Minas. É um trecho bem conhecido, mas fiquei curioso para ver como estavam as condições da estrada e, já que era para fazer um off road e sujar a moto, melhor começar a pegar terra o quanto antes.
A estrada de chão estava muito boa e bem cuidada, apesar de muita poeira e alguns bancos de terra fofa. Normal para o período de estiagem e para o clima no inverno. O dia estava perfeito, com o céu completamente azul. Nas proximidades de Antônio Carlos, o piso passa a ser asfaltado e, por incrível que pareça, os problemas começaram. De repente senti a traseira da moto meio bamba justo quando passava por sobre umas manchas no asfalto. Isso só poderia significar duas coisas naquele momento: óleo na pista ou pneu furado. Para meu azar, foi a segunda opção.
Quando parei, o pneu já estava praticamente "no chão". Estava próximo da cidade, mas não sabia o quão próximo estaria de um borracheiro. Perguntei a um menino de bicicleta que, por sua vez, perguntou ao avô numa uma casa ali perto. Borracheiro, só no centro da cidade. Tudo bem. Sempre ando com um reparo de pneu comigo. Em percursos longos, carrego inclusive câmaras extras, mas não foi o caso para um passeio tão curto. Coloquei a moto no descanso central, girei a roda traseira e vi a cabeça do que parecia ser um prego. Não consegui tirar com as chaves de fenda que carrego e, antes de tirar as ferramentas originais da moto (tem um pequeno alicate no conjunto), perguntei ao senhor, avô do menino, se ele tinha algum alicate, ao que ele respondeu: "Meu filho, aqui tenho de tudo, menos dinheiro!" Kkkkk. Consegui tirar o prego. Gigante. Devia ter uns 5 cm de comprimento. Apliquei o reparo rápido e o pneu começou a encher. Mas algo deu errado: apesar de ter enchido, logo ouvi um barulho de ar vazando pelo bico. Bem, sem demora, coloquei a moto para rodar (recomendação do produto, para vedar os furos) e segui direto para a cidade.
Encontrei uma loja de bicicletas e perguntei por algum borracheiro. O senhor me indicou dois locais, um de carros e uma oficina de motos em um casarão antigo. Eram próximos e não haveria problema, a não ser pelo fato do pneu ter esvaziado novamente (o tal do vazamento pelo bico). Apliquei novamente o reparo, o conjunto pegou ar mais uma vez e lá fui eu. Acabei parando na oficina de motos e relatei o ocorrido. Conclusão do imprevisto: o estrago tinha sido considerável. Como viajo e já tive problema com remendo há muitos anos lá em Morro do Ferro, resolvi comprar uma nova câmara ali mesmo. Bom também que ajudo mais o borracheiro que me ajudou.
Reparo feito, moto pronta novamente, pensei em voltar para casa. Qualquer mexida em pneu traseiro de moto demora bastante e acabei ficando um bom tempo na oficina, conversando e acompanhando o trabalho. Mas, ainda era relativamente cedo e João Ayres estava logo ali, depois de alguns quilômetros de terra. Resolvi seguir e aproveitar o dia. Imprevistos acontecem, mas por que impediriam o passeio? Parei no posto no centro da cidade, ajustei a calibragem e segui em frente.
Logo depois de Antônio Carlos, neste trajeto, tudo é terra. Mas a estrada estava ótima, muito bem conservada. Dava para rodar até bem rápido. Tirando as grandes nuvens de poeira ao cruzar com outros veículos, parecia até asfalto! Quando comecei a margear de perto a linha férrea, lembrei-me da localização aproximada do memorial, que inseri no meu GPS. Avistando ao longe uma casa, percebi uma trilha que descia até a linha férrea e, mais perto, não tive dúvidas. Colocaram até uma placa desta vez. Parei a moto e fui visitar o memorial.
Trata-se de uma lápide de pedra com inscrições e datas, colocada ali ao lado da linha no ano de 1959, bem no local onde, na madrugada de 19 de dezembro de 1938, ocorreu uma verdadeira tragédia ferroviária, com uma batida de frente entre um trem de carga e um trem noturno de passageiros repleto de crianças e adolescentes de um grupo de escoteiros. Há, pelos relatos, grande divergência do número de mortos, mas algumas fontes contam mais de 40 mortos somente na noite do desastre. O escoteiro Caio Vianna Martins destacou-se no auxílio aos feridos e recusou ajuda, mas estava mortalmente ferido e veio a falecer na noite do mesmo dia. Sua história pode ser encontrada no ótimo site Estações Ferroviárias do Brasil, inclusive com reportagens de jornais da época. Homenagens (bustos, praças, estátuas e até mesmo um estádio) espalham-se por várias cidades brasileiras, tamanha a repercussão do acidente na imprensa.
Do memorial, o plano era continuar e revisitar a velha estação de João Ayres. Saindo da estrada principal, o acesso para a estação estava em condições muito mais complicadas. Estrada estreita, com mata-burros, muitas pedras e passagens com água. Apesar do progresso lento, foi bem legal e, desta vez, pude realmente chegar perto da construção, que infelizmente, está completamente abandonada. Sem qualquer vestígio do antigo telhado, sua imponência só pode ser percebida ao se olhar para suas grossas paredes de tijolos aparentes e os detalhes que ainda resistem da pintura original dos letreiros. Uma pena.
Agora tinha duas opções: voltar pelo caminho tradicional de onde vim ou seguir para averiguar uma ligação daquelas estradas com o distrito de Curral Novo. Claro que, aproveitando o dia perfeito, segui mais à frente, apesar da estrada bem ruim. Um trecho em especial, aparentemente utilizado por madeireiros, estava bem desafiador. Foram despejados cacos de pisos cerâmicos, ardósias e acabamentos de mármore e granito na estrada, acredito que com o intuito de evitar a formação de lamaçais no período de chuvas. Só que as lascas lisas deslizavam muito umas sobre as outras e voavam para todo lado enquanto a Ténéré passava. Um caos. Apesar disso, a moto foi valente nas subidas e fui buscando as partes com menor quantidade desses refugos. Quando alcancei a via principal (saindo do acesso a João Ayres), o piso melhorou muito e foi possível novamente andar bem, apesar da terra toda.
Alcancei sem problemas Curral Novo e, de lá, seria um passeio asfaltado para Antônio Carlos e depois de volta a Barbacena. Apesar de alguns buracos, que estavam sendo remendados por uma equipe na via, o retorno foi bem tranquilo. Aproveitei para passar no banco em Antônio Carlos, de onde voltei ainda a tempo de almoçar com a minha lindinha, que está em um ritmo alucinado de estudo para as provas do final do semestre da sua faculdade.
Sempre bom conhecer mais um pouquinho da nossa região!
¹ Em termos de distância, claro, pois já dá para notar pelos destinos no blog aqui que não temos ambição nenhuma de conhecer lugares maravilhosos. O negócio é rodar sempre, não importa para onde exatamente...
Lindo passeio, e com o pneu furado, vira aventura. Motociclismo sem aventura não é motociclismo. Ja passei por aventuras dessas. Na hora é ruim, mas.....temos historias para lembrar e contar. Valeu, só valeu.
Lindo passeio, e com o pneu furado, vira aventura. Motociclismo sem aventura não é motociclismo. Ja passei por aventuras dessas. Na hora é ruim, mas.....temos historias para lembrar e contar. Valeu, só valeu.
ResponderExcluirÉ isso aí, Tio Célio. Quando não se tem aquela gana de chegar, chegar... Dá para curtir todo o caminho e mesmo os percalços!
Excluir